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Haveria outras fórmulas de sexuação possíveis?[1]

Ligia Gomes Víctora

As chamadas fórmulas da sexuação não surgiram de repente na obra de Lacan, mas foram sendo construídas, tijolo por tijolo, durante anos em seus seminários e escritos.

Talvez se possa localizar a pedra angular desta construção mais claramente no texto A significação do falo, de 1958. Este é um texto fundamental na álgebra lacaniana, embora as expressões ainda não fossem escritas ali em forma de algoritmos, as relações dos sexos com o falo estão todas apresentadas.

Lacan (1958) começa esta conferência afirmando que “o complexo de castração inconsciente tem uma função de nó”.  Não se trata de um nó tal como seria abordado nos seminários dos anos 70, ou seja, enquanto cadeia borromeana, mas sim no sentido plano, como um point capitoné ou um cruzamento de pontos. Lacan ressalta esta relação, por um lado na estruturação dos sintomas, por outro nas determinações inconscientes das identificações e escolhas sexuais. Nesta conferência, que apresentou em alemão na cidade de Munique, explica claramente a função significante do falo, diferenciando-o enquanto órgão e enquanto simbólico.

O falo é aqui esclarecido por sua função. Na doutrina freudiana, o falo não é uma fantasia, caso se deva entender por isso um efeito imaginário. Tampouco e, como tal, um objeto (parcial, interno, bom, mau etc.), na medida em que esse termo tende a prezar a realidade implicada numa relação. E é menos ainda o órgão, pênis ou clitóris, que ele simboliza... Pois o falo é um significante, um significante cuja função, na economia intrasubjetiva da análise, levanta, quem sabe, o véu daquela que ele mantinha envolta em mistérios  Pois ele é o significante destinado a designar, em seu conjunto, os efeitos de significado, na medida em que o significante os condiciona por sua presença de significante. (Lacan, 1958. Escritos. P.3475)

Em 1962, Lacan (Seminário A identificação. Lição 10, 21/02/1962) – já com o suporte da Topologia – apresenta a estrutura do plano-projetivo tendo significante Phallus[2] como ponto de intersecção, lugar de convergência simbólica no corpo imaginário, e também onde se abriga o objeto do desejo.

Tudo gira em torno da dialética freudiana entre o ser e o ter o falo. Lacan redescobre e desenvolve este raciocínio de forma magistral. É uma lógica absolutamente binormativa: se o homem tem o órgão “concretamente” incrustado no corpo, suas relações com o significante Phallus são mais fixas, se submete à castração simbólica de modo muito mais rígido do que a mulher, que não tem um órgão fálico preso ao corpo. A ela só resta ser o falo para os outros. Logo ela não precisa se sujeitar da mesma forma às leis da castração. Os efeitos disso são as formas de gozo que cada um pode alcançar. O gozo fálico, preso à linguagem, faz resistência a uma outra forma de gozo, chamada por Lacan de “gozo do outro”. Logo a mulher poderá alcançar este outro gozo com mais facilidade, enquanto que o homem ficaria submetido ao gozo fálico, sendo a exceção quando o atinge. Veremos sobre as questões do gozo mais adiante.

Lacan aborda as questões trans poucas vezes e sutilmente, como em 1971, comentando o livro Sexo e gênero – de Robert Stoller (1968). Afirma que o autor falha ao não compreender a face psicótica dos casos de transexuais a que se refere no livro.

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[1] Resumo do seminário de Topologia proferido na APPOA, em 09/09/2016.

Notes